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segunda-feira, 29 de julho de 2013

«Senhor Comandante... A Carta Assassina» de Romain Slocombe - Opinião


Antes de mais uma sugestão musical:

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Senhor comandante - Uma carta assassina é um daqueles livros que tem de ser lido pelos amantes da segunda guerra mundial e deve ser lido por vários motivos. O primeiro motivo é que se trata de um relato com base em documentos verídicos, ou seja, a carta. O segundo motivo é conseguir infiltrar-nos na mente de uma pessoa que viveu momentos, no mínimo, perturbadores.

Aqui relata-se, em forma de carta, a mente de um escritor francês da alta sociedade que durante a ocupação nazi apoiou a causa Nacional-Socialista.
Podemos ver aqui a irregularidade da mente deste escritor, vemos por um lado os seus ideais mais convictos, a ideia de França como um pais de cavalheiros, um pais de trabalhadores, de honra, de orgulho e sobretudo de família e depois o seu ódio pelos judeus,  pelo que representavam na sociedade, a ganância, a descrença na família e para finalizar esta mistura de ideais temos o amor do escritor por um judia... mulher do seu próprio filho.

Nas primeiras páginas temos uma mostra de tudo o que ocorrerá durante todo o relato, levando-nos a pensar que não pode advir daí muita coisa deste livro. No entanto, estamos bem enganados!

"(...) Xavier Valat, prestigiado inválido da Guerra de 14-18, onde deixou uma perna e um olho: um homem de sentimentos católicos e nacionais profundamente enraizados, determinado a erradicar por completo - qual cirurgião armado com o seu escalpelo atacando o tumor mortal causado pelo corpo estrangeiro - a cultura judaica de França."

Romain Slocombe faz-nos percorrer vários lados desta guerra, lados mais escondidos, lados mais cruéis, tanto pelos nazis como pelos franceses e seus apoiantes, ou até pela resistência e pelo próprio povo, depois de vitoria da resistência.

Paul-Jean, a nossa personagem, o nosso escritor, descreve-nos a vida quotidiana de uma cidade pacata em França, antes, durante e depois da guerra, descreve-nos os seus habitantes e as suas ideias, bem como as suas alterações que estes sofreram por causa da guerra.

Com os relatos descritos na carta, o tal documento que avança e nos transporta, somos capazes de, ora compreender algumas das atitudes desta personagem e até simpatizarmos com ela, para logo a seguir o odiarmos. É um misto de tentarmos perceber que ele luta pelos seus ideais, apoiando e recebendo apoio de um regime, difundindo assim o seu ódio pelos judeus. O melhor do livro é que ainda somos capazes de assistir ao esforço que faz para manter a salvo o seu amor, uma mulher que não podia ser pior - é judia e é a mulher do seu filho!?

Uma carta perigosa, um relato estratega, uma luta política na defesa pelo preconceito racial, mas igualmente uma confissão, o amor, o desvendar de segredos e humilhações de guerra... quem sabe justificações para os horrores da guerra... a ganância das pessoas que ao verem outros em debandada aproveitam para enriquecer "cobrando 3 francos por um litro de água".

A escrita veloz e ritmada do autor, faz-nos ficar presos às palavras, por vezes ásperas e ardilosamente bem escolhidas. Há também tempo para descrever as milícias francesas, criminosos e torturadores, recrutados pelos nazis e os seus métodos de interrogatório, métodos esses que o autor descreve e nos leva a ter grandes arrepios na espinha e pensar como é possível tal crueldade.

Para o fim é nos deixado a surpresa que não vou revelar.

Uma leitura com o apoio da Bertrand Editora.


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