"Livro sem ninguém"... um livro cheio de rastos de gente!
Gente que ama, que sofre, que lê, que estende roupa, que se passeia, que vai à horta... Gente com eu, como tu, como todos. Gente (quase) sem livros, num livro sem ninguém.
Há demasiadas coisas, objectos, episódios, descrições que não assentam em ninguém.
Há como que um esforço quase megalómano para desumanizar o livro, caindo quase na ausência de enredo. Já que é difícil a abstracção e a ligação às cores, às cuecas, às pegadas na terra, à mesa, à bengala... às coisas sem gente. A coisificação não enreda o leitor e reduz o livro, não permite a ligação às coisas como se elas fossem personagens. O autor quer tornar as coisas de cada um, nas de todos e assemelhar todos a nenhum, a ninguém... no meio fica o nada, porque o leitor co-criador (assim talvez fosse suposto), perde-se nos passos que vão para a horta, na beleza das descrições floridas e onde brota cada estação do ano, mas faltam as pessoas a quem dar rosto, conteúdo e acções... nomes!
Resta-nos a beleza descritiva, excelentes parágrafos de ode à natureza, mesmo que esquadrinhada numa rua. Resta-nos as cores e o apelo aos sentidos, numa rua pintada pelo arco íris... que a certa parte nos permite ver e talvez até sentir o mar, mas também a sombra das torres, ambos gigantes que ladeiam a rua e limitam o livro.
Se pela corda da roupa se estende a genialidade da linguagem do autor e a autenticidade da ideia, as mesmas são presas por molas frouxas, num enredo colorido, mas que não cativou esta leitora.
Leitor = pessoa que segue rua fora, senta no banco do jardim, imagina o arco, a rua, o estendal, encontra semelhanças na vizinha, na vespa estacionada à porta, no livro que pousa no banco, mas não consegue dar corpo aos personagens, não engorda o enredo...
Uma leitura com o apoio LEYA
Achei a ideia brilhante, mas foi me difícil ler este livro... a leitura não fluía, senti como que uma solidão nas paginas... como se tudo estivesse morto.
ResponderEliminarFoi uma grande contradição na minha cabeça.
Não me arrebatou , mas foi foi um excelente exercício mental.
tenho o outro dele para renovarmos o exercício mental
ResponderEliminarNão há nada sem dono, queridas Cris e Philipa, acreditem, mas entendo a dificuldade. Não é um exercício fácil e nem toda a gente se adapata a ele. Talvez ambas sejam mais leitoras da Manhã do Mundo, mas não descartem este. Talvez um dia possamos fazer o exercício em conjunto, numa das sessões colectivas que vão acontecendo. Como é formalmente diferente, se quiserem, cada um tem de construir o seu livro. Eu sei, parece fraude, como quem vai para o restaurante cozinhar, mas este não é o livro que nos leva, mas o livro que tem de ser levado, costurado. :) Obrigado e beijinhos a ambas.
ResponderEliminarAgora que reli o que escrevi e que recordo a beleza de algumas palavras do livro e que vi o comentário do autor, fico com vontade de uma nova leitura, volvidos 4 anos. Como leitora estarei certamente um pouquinho diferente.
ResponderEliminarObrigado, Cris. isso é muito bonito, e mostra o poder autónomo dos livros, aquele que nos transcende a todos, e contudo nos toca :)
ResponderEliminar