Conhecem aquela sensação ao abrir um livro e voltar a lê-lo, aqui e ali, seguindo os cantos dobrados, as folhas mais marcadas, as frases sublinhadas e redescobrir o que tanto nos atraiu e nos fez ficar presos nesse livro!? Foi isso mesmo que me aconteceu quando ontem peguei para comentar este último romance de Sandro William Junqueira (SWJ) que já li em Agosto.
Não deixei por rever este livro por acaso. Há tanto de extraordinário como de comum neste romance de contornos meio surreais e distópicos, mas igualmente semelhante aos dias de hoje, com tudo o que de nefasto existe nos flagelos actuais. Existe fé, mas não vence a corrupção do corpo. Existe deus, mas é conspurcado pela mente dos homens. Poderia existir amor, mas o poder fala sempre mais alto... talvez haja inocência, mas é confundida com desconhecimento ou falta de sofrimento. Existe humor, mas lapidado pelo lado negro.
Sandro William Junqueira junta as dualidades mais opressivas que o ser humano acarreta em si e transporta-as para um lugar desconhecido que poderia ser o país de qualquer um, mas planta a acção perto do mar ;() onde a Avó consegue sentir a aragem marítima. Separa o Norte do Sul, atribuí grandezas a uns e fome de tudo a outros, mas separa-os por uma fronteira tenebrosa, mas ténue onde os interesses e o poder se confundem em prol dos desejos e das necessidades fúteis dos mesmos do costume.
Não é fácil fazer-me entender ao falar deste livro sem ter a tendência, ou para explicá-lo (conforme eu entendi) ou para enredá-lo e complicá-lo um pouco mais. É complexo, sim. A forma e a estrutura que assume é diferente, não será novidade para quem leu o romance anterior, mas não deixa de ser complexo imaginar todo um enredo sem espaço geográfico definido, tempo ou nome para as personagens. A Avó é assim nomeada pelas características óbvias, como o Bispo, pelas funções que desempenha, ou o Padre, ou até a Adolescente evidentemente pela idade e outros atributos.
A espontânea maldade intrínseca no argumento que compõe este "No céu não há limões" é, a meu ver, um olhar atento à Humanidade e aos dilemas intemporais e existenciais que o ser humano atravessa nas várias idades da vida, mas essencialmente naquela em que questiona o sentido e a direcção da sua missão, do seu papel e talvez questione a presença de uma mão superior, abstracta e poderosa que possa garantir o seu caminho. Mas isso não acontece de forma suave e muito menos sem perguntas e dúvidas.
Estou a falar de fé, de religião, de acreditar ou não em Deus e decidir o que sentimos segundo as leis dessa crença, dessa espiritualidade. Não sei se esta é a essência deste romance, mas foi isso que ficou evidente para mim. Em que ponto da nossa vida procuramos a fé e a espiritualidade? E quando surge, é facilmente absorvida ou somos antes de tudo absorvidos para os dilemas e os problemas associados?
Penso no lado menos colorido deste tema, pois o livro segue esse lado mais negro. Um lado que desenterra o passado, um lado que verte sangue e derrama lágrimas. Julgo que o centro da acção deste enredo está precisamente nessa maldade que aguarda a queda do homem. À distância de promessas sem compromisso ficam acções que poderiam salvar as almas e orientá-las num futuro melhor, mas sente-se pouca esperança ao longo das páginas.
A missão falha, arrasta-se e está obstipada. Há um certo azedo que acidifica todo este cenário estruturado para o que é feio e que torna os homens em meros figurantes. Um discurso recheado de metáforas para a ficção em que se tornou o palco da vida.
E julgo que não podia ter encontrado melhor parágrafo para finalizar, tentando fazer justiça ao único traço belo deste romance: a linguagem extremamente funcional mas lírica com que Sandro Willliam Junqueira consegue compor, usando palavras simples, mas que não podiam ser as mais adequadas.
Uma leitura com o apoio EDITORIAL CAMINHO.
Olá!
ResponderEliminarUltimamente tenho visto muitas recomendações sobre este autor. Tenho muita curiosidade para conhecer alguns livros dele, especialmente esse!
Boas leituras!
...quero ler esse!!
ResponderEliminar( eu sei eu sei, ando muio lenta...)
:)