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quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

“Manual de sobrevivência de um escritor”, de João Tordo :: Opinião


Auster, Melville, Rilke, Mishima, Pessoa, Kafka, Tolstói, Dostoiévski, Levi, Camus, Javier Cercas, Javier Marias, John Cheever, Ian McEwan, Raymond Carver, Joyce, Philiph Roth, S. King, Denis Johnson, Bolaño ou Baudelaire... 

"Sem todos estes nomes, não me teria tornado escritor. Sem a companhia de todos eles, sem a companhia dos mortos. Por isso, concluo que um escritor é uma estranha e improvável mistura de tradição colectiva e patologia individual, de uma ferida aberta, muito particular, e do caminho que outros, antes de si, lograram explorar e que ele vai percorrendo com paciência e humildade.

"A literatura nasce de uma necessidade quase atómica de ordenar aquilo que surge catastrófico, de reunir num volume a fragmentada experiência humana."


Regressando a uma aventura na feira do livro em 1986 até ao confronto com "Crime e Castigo", João Tordo traça um retrato de como pode ser a sobrevivência de um escritor a braços com tamanho legado que são as vozes da literatura, vozes essas que povoam o universo alienígena desta legião de infelizes e insanos que são os escritores, um regime de eremitas, donos de uma disfunção social que os remete para o isolamento, a depressão, a melancolia e uma dispersão caótica em perpétua mudança que só encontra estrutura (ou cura) na ficção. 

Ir em busca de referência e ver como se cruzam com o autor e a escrita dos seus livros, é a meu ver o ponto alto deste Manual. É com muitas palavras de outros que Tordo organiza e justifica as suas, quando compõe, capítulo a capítulo, passando a pente fino este ofício que vive de inquietude, da emoção, da linguagem e de buracos da agulha.

"Se a emoção é a raiz, a imaginação alimenta-se de quê?"
"Olhar para a vida com a perspectiva de descobrir o buraco da agulha, o lugar através do qual entra a possibilidade de uma história. (...) o verdadeiro mistério é o visível."
"(....) perguntar o porquê (...) não importa; a pergunta é desinteressante; tem um travo académico que abala o fundamento de toda a efabulação."

Todo o peso está no poder da efabulação, salientada na obra de nomes maiores da literatura pelos quais nos vamos perdendo entre realidade e verdade e ficando despertos para inúmeros títulos pela forma como Tordo fala deles.

Sobre «Detectives Selvagens»:
"O enredo está presente, mas não passa de uma sombra - traçar um enredo para esse livro é como tentar seguir todas as ramificações de uma teia de aranha ao mesmo tempo."

Sobre «O ano da morte de Ricardo Reis»:
"(...) a melancolia é a cor do livro; e a melancolia é uma forma de beleza que merece aplauso."


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