A Vida de Pi, foi sem dúvida um enorme prazer, uma excelente forma de começar as leituras de 2013.
Francamente eu nem sei por onde começar, até porque esta crítica já teve diversos começos, aliás até já teve um fim, sem ter um princípio.
Digamos que A Vida de Pi é desde as primeiras palavras até ao último diálogo um misto de sensações, onde nos decidirmos pelas palavras adequadas é muito difícil.
Pi (porque aqui o que importa é Pi - a importância de um nome) relata os excruciantes 227 dias de sobrevivência em mar-alto, relatando rotina onde só podia existir caos, afirmando fé onde só podia existir desesperança, revelando dúvida quando a natureza humana e animal se confundem, aumentando a solidão onde nada pode parecer mais só, revelando cumplicidade onde só poderia haver perigo, tornando desafiante o próprio desafio, relatando diversão onde só podia existir preocupação, descobrindo vida onde só reinava medo... e entre tantas coisas mais onde só o credo em Deus poderia trazer a Pi a sobrevivência a quase 7 meses de naufrágio.
Piscina Molitor Patel ou Pi, tem de certeza uma conotação numerológica atribuída à abreviatura Pi o que é logo em si um sinal de forte conotação e relação entre todos os números presentes no livro. A conotação simbólica do 3, como número de equilíbrio e união, 3 nomes, 3 credos diferentes, um único Deus, uma fé tão forte como a própria conotação do nome Pi. A conotação do número 7 para os meses que esteve à deriva, sete é relacionado com a noção do tempo ou a falta dela, já que este número relaciona-se com os limites do que é material. 7 são os dias de uma semana, 7 são as cores do arco íris, 7 são as chagas de Cristo, os pecados capitais ... 7 é a passagem para o mundo espiritual...
Platão dizia: No sétimo dia foi criada a "alma do mundo"
Por curioso que pareça a numerologia aplicada ao nome completo de Pi, dá um 2 - será alguma metáfora para Pi e Richard Parker? Ou será 2 aplicado às 2 histórias diferentes para os 227 dias... ou os 2 diálogo fascinantes já quase no final do livro.
Mas agora aplica-se apenas ao nome Pi e veja que resultado dá!? 7
Apesar de não ser minimamente entendida nestes assuntos e não ser propriamente uma pessoas de números, confesso que me suscita sempre alguma curiosidade e neste livro é fascinante só ter relacionado essas pequenas coisas. É como o 100, o livros tem 100 capítulos, e os evangelhos referem o 100 como o fruto dos mártires, termina ali no capítulo 100 o martírio de ser náufrago ou serão 100 capítulos para contar a parábola religiosa, "cem por um..." a parábola sobre a semente deixava pela palavra de Deus.
Ora, se esta primeira parte da minha critica foi mais enfadonha ou nefasta para a sua leitura e já pôs a sua cabeça à roda, é esse o efeito sentido nas primeiras 100 (e lá estão os números) páginas deste livro. Depois tudo muda, tudo dá uma volta de 180º graus e uma vida familiar alterada será o começo do fim para Pi. Digamos que esta breve incursão pela numerologia tende a ser como a jornada de crença dividida e altamente questionada pelo credo de Pi no hinduísmo, cristianismo e islamismo.
Mas, passemos à outra jornada, à da sobrevivência e sejamos práticos e ao género do livro façamos uma lista:
- um praticante de 3 religiões
- uma família em mudança
- uma viagem para um novo mundo
- uma paixão pelos animais
- um naufrágio
- um barco salva vidas ao género arca do Noé
- se é Noé, há animais: um orangotango, uma zebra, uma hiena e um tigre
- um oceano e os tubarões
- o arco íris, o sol, a chuva, as tempestades, a água salgada
- os mantimentos, os alambiques, as tartarugas e as douradas pitéu
- agulha, linha, lanternas, remos, taças, baldes, sacos, arpões, âncoras... 1 pacote de cigarros chineses, 1 manual de sobrevivência, 1 caderno de apontamentos e 2 esferográficas...
... a lista poderia continuar, podia incluir eventos e uma agenda diária das rotinas permitida a um naufrago em mar alto.
A minha critica poderia explicar-vos mais sei lá quantos motivos, dar-vos alertas, referir outras listas, destacar palavras, enunciar capítulos favoritos, fenómenos sobre a pesca, curiosidades sobre animais... mas isso tudo seriam spoilers e como eu nem o trailer quis ver, aliás esta critica está a ser escrita ainda sem sequer ter ido ver o filme, porque Yann Martel é tão bom com as palavras em todas as suas descrições, que desde o quarto de Pi, ao barco salva vidas, ao pêlo de Richard Parker, ás ilusões e delírios finais que tudo o que eu mais poderia dizer seria: banal!
Assim deixo-vos com algumas das passagens que mais me marcaram:
- a descrição do quarto de Pi, um hino à oração e à fé
- o porquê de uma só religião e algumas ilações curiosas
- a 1ª morte às mãos de Pi... ao qual chamei Sushi time
"A dourada fez a coisa mais extraordinária ao morrer (...) senti que estava a espancar o arco íris até à morte."
- 227 dias no mar, a fé na sobrevivência
"O medo é o único adversário da vida!"
"o medo (...) começa sempre na mente... a ansiedade torna-se pavor, depois o medo trabalho todo o nosso corpo. Tomamos decisões irreflectidas. O medo (...) aninha-se-nos na memória como gangrena: procura apodrecer tudo!"
Para além de destacar o medo, há que destacar a fome e a fé numa ilusão ou num delírio:
"caiu na minha taça com um tinido e não há dúvida de que aqueles que não compreendem o grau do meu sofrimento quando digo que aquilo soou aos meus ouvidos como música de uma moeda de cinco rupias na taça de um pedinte considerarão que eu abandonei os últimos vestígios de humanidade."
Enfim, A Vida Pi é um relato de fé, de humanidade e de sobrevivência.
Um excelente arranque de leituras para 2013.
Hoje o filme!
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