Não sei se chega a ser terror psicológico aquilo a que o nº 1 de Folgate Street ascende e faz aos seus inquilinos ou se é apenas tudo o que lhes vai na alma.
"Estou sentada na espartana e branca austeridade do nº 1 de Folgate Street, muito satisfeita.
O meu olhar varre o imaculado vazio do jardim. Já descobri porque não tem flores. Inspira-se naquilo que a Internet me diz serem os karesansui, os jardins para meditação formal dos templos budistas."
O enredo navega em torno de uma casa, ou melhor, de uma peça de arte arquitectónica minimalista - arquiminimalista -, ganhadora de prémios e que atribuiu ao seu arquitecto, Edward Monkford, toda uma aura de génio, mas também de esquisitóide. E a exigência e dependência cada vez maior da tecnologia como um comando que regula e potencia a felicidade.
"Como arquitectos, somos obcecados pela estética, somos obcecados em criar edifícios que são agradáveis ao olhar. Mas, se aceitarmos que a verdadeira função da arquitectura é ajudar as pessoas a resistirem à tentação...
Mas que dizer da tecnologia? O que dizer daquela cidade invisível onde todos passeamos, ou nos escondemos, ou nos divertimos: a Internet?"
O constante Antes e Depois, com Emma e Jane, cria uma vontade imensa de perceber em que é que aquelas duas vida, naquela casa, se cruzam. Edward e Simon combinam muito bem psicoses destrutivas, mas elas também não o são menos. David ou Saul são dois personagens secundários que, de forma parca, mas muito incisiva determinam nuances do enredo. Considero que está tudo muito bem conseguido.
"Agora: Jane
(...)
Tenho dificuldade em concentrar-me. Não consigo parar de pensar no facto de ele ter proferido exactamente as mesmas palavras a Emma e a mim. (...)
Mas, também, penso, todos usamos as mesma frases conhecidas, os mesmos atalhos linguísticos. (...) Quem, por vezes, não se repete? Não será a compulsão para a repetição apenas um termo sofisticado para o facto de sermos criaturas de hábitos?"
Paranóia, obsessão, narcisismo, mitomania, repetição e manipulação, em dose curtas, mas constantes alimentam a desconfiança que é exigida ao leitor, para assim manter o interesse e a compulsão de leitura.
"- A teoria de Emma era que enterrá-los aqui fazia parte de uma espécie de ritual supersticioso - continua. - Quase como um sacrifício. (...)
Um livro compulsivo e viciante, construído quase com o mesmo minimalismo que imaginamos para a casa, cada detalhe aparece no local certo, despertando o leitor tanto mais temas da actualidade, como para arquitectura, tecnologia ou costumes ancestrais e orientais.
Recomendação máxima para os fãs do género ou para quem quer um enredo psicológico.
Uma novidade
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