Perante a morte da pastora protestante, Mildred, adentramos em Kiruna. Conhecemos o gene policial de Asa Larsson na personificação de várias personagens fortes. Mulheres fortes. Eu diria até, mulheres fortes protegidas por uma loba solitária e fugidia e é dessa forma que as árvores ganham mais vida, os ruídos espessura e o enredo um outro tom que eleva este policial nórdico.
Foi uma
bela estreia no universo de Asa Larsson! Tanto, que mesmo com o rabo sentado na areia e entrevalando as leituras com banhos de mar e sol, cheguei a sentir o frio e a escuridão daquelas terras nórdicas, silenciosas e misteriosas.
Embora tenha sido uma estreia, a história de Rebecca Martisson arrancou num livro anterior, mas as pistas estão todas nas entrelinhas e é como se existissem dois crimes por desvendar, não obstante, eu estar mais preocupada em saber da loba e querer saber que continuava intocável. Portanto, neste "Sangue Derramado" apanhamos uma Rebecca meio fugida, meio perdida, para quem as coisas ultimamente só lhe entram na cabeça à força. Depois os últimos acontecimentos, sente o seu mundo de pernas para o ar, mas observa com muita lucidez que todos à sua volta andam «com a fita métrica a postos nos bolsos».
Sente-se observada, analisada e medida por tudo o que diz, mas essencialmente pelo que não faz ou não diz. Para além de estar rodeada de uma equipa onde todos lutam por protagonismo, estão todos à espera que se passe novamente da cabeça e resvale, dando sentido à opinião de alguns que acreditam que ela não é a melhor escolha para ir a Kiruna. Assim sendo, este «Sangue Derramado» pode muito bem ser o cenário ideal para isso, já que Kiruna é precisamente a terra que a viu nascer.
Como se isso não bastasse, o enredo envolve um crime na
paróquia, uma mulher à frente desse posto de comando. Coisa rara! E ainda por cima uma
feminista e defensora de que já é mais do que tempo de contrariar o sistema
e fazer as coisas avançar. Mudar. E a mudança assusta muita gente. Pior, a mudança sugerida (ou imposta) por uma mulher. Aliada a outras mulheres.
Larsson não poupa a sociedade escandinava, a religião, as
comunidades pequenas e tacanhas e os atentados ambientais mesmo naqueles que
parecem ser paraísos de gelo, lugares sagrados, recônditos e intocáveis. Ou assim se esperava.
Larsson lança pedradas, umas atrás das outras, como que a avaliar a que distância está o fundo do poço.
O que de lá se ouve? Ou reluz?
A sua escrita e
capacidade de saciar o leitor, fazendo-o querer avançar, capítulo a capítulo, enquanto
ela vai afogando os seus personagens em mentiras, ódios, crimes e
segredos. E claro, o amor! Servindo-se de diferentes tipos de amor, mas
essencialmente um muito grande à Natureza e aos Animais. E arriscaria dizer:
às pessoas, que na sua solidão, isolamento e bondade tantas vezes abusada, comentem crimes;
a sua literatura não os exonera, mas tenta mostra que a linha é ténue e qualquer um pode cometê-los.
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