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terça-feira, 30 de abril de 2024

«Três» de Valérie Perrin :: Opinião

Quando nos dizem que um livro tem uma personagem que é parecida connosco a curiosidade fervilha e a leitura é inevitável, certo?

Foi o que aconteceu com «Três» de Valérie Perrin e também por ser um livro que vem com banda sonora e ter música faz toda a diferença. 

Ainda assim, para as aventuras de Nina, Adrien e Étienne e claro Virginie 😉 faltaram algumas como, «She lost control», uma ou outra incontornável dos Depeche; ou então, basta colocar a masterpiece dos Nirvana, «Nevermind» e deixá-lo em repeat.

“And for this gift I feel blessed
Our little group it's always been
And always will until the end”


Ainda assim, desde o início, a minha cabeça cantarolou muitas vezes a eterna «Le Temps De L'amour» de Françoise Hardy, muito por culpa desta introdução:

domingo, 28 de abril de 2024

«A mãe e o crocodilo» de José Gardeazabal - Opinião

“A minha mãe conta que comecei a caminhar para trás. Ela dava-me a mão e eu avançava de costas, sem sequer olhar. Não acredito. A minha mãe diz que foi precisa imensa paciência até eu me resigna a andar para a frente.”

“Os sentimentos são um lago onde as pessoas se molham até ao pescoço e eu estou do lado de fora porque não sei nadar.”

Este é Vladimir e nós vamos continuar na dúvida como ele. Ou vamos duvidar dele. É uma escolha do leitor e vai determinar o quanto nos podemos divertir, sensibilizar, rir ou chorar com as dúvidas dele, do crocodilo e do gato que domem juntos no cimento, com a mãe, os vizinhos e vamos ainda pensar nas suas dores e dúvidas perante o mundo. Vamos cavalgar juntos no crocodilo e filosofar com eles. 

“A minha mãe está há três anos a falar sozinha a tentar dizer o que pensa. Não é muito tempo.”

Vladimir é filho de pai solteiro e mãe solteira, vive a cuidar da mãe e de Benito, o crocodilo 🐊 Vivem os três à procura de se compreendem enquanto esperam o futuro, porque o futuro é um sítio onde se pode gritar, mas... “Na nossa casa, o passado e o futuro são tão iguais que não lhes vemos a cara quando dançam.” 

terça-feira, 16 de abril de 2024

«Amor estragado» de Ana Bárbara Pedrosa :: Opinião

"Um dia, depois de um bagaço, desabafei com um amigo, que tinha sido burro e era padre. Coitado, aquilo dava-me pena. Passava os dias no meio de velhas beatas e nunca ia saber que o único milagre que existe está num corpo de uma mulher a dizer que não quer mais."

Que se sublinhe "num corpo de uma mulher a dizer que não quer mais"

Embora seja uma premissa mais do que errada, abusiva, violenta, tóxica e transtornante, essa é a premissa para se entrar na cabeça do Manel, e por sua vez, na voz que a Ana Bárbara tão acutilantemente criou para nos destabilizar com esta história desestruturante e destruidora de tudo o que pode ser uma relação e uma família, menos amor, desejo, compreensão, empatia, cumplicidade ou sequer intimidade. Tudo o que aqui nos surge perante os olhos e nos assome à garganta como asco e vómito, é uma dura e triste realidade. É a realidade de muitas famílias, mulheres e filhos. Uma realidade que pode estar debaixo do nosso nariz, na porta ao lado, no quarto por baixo do nosso, na nossa família, na casa do nosso irmão. É a realidade e nós fazemos parte dela. Por isso, metade do asco, da aspereza e da realidade está-nos debaixo das unhas e isso é feito com uma mestria brutal e desarmante, conseguida nesta escrita crua e estragada de Ana Bárbara.

terça-feira, 2 de abril de 2024

«Lições de Grego» de Han Kang - Opinião

Não aprendi grego, mas como se costuma dizer, vi-me grega para chegar ao fim deste romance labiríntico e enigmático de Han Kang. Não chegam a ser duzentas páginas, mas o leitor fica perdido entre as aulas, o mutismo, as ideias complexas, a dificuldade de apanhar o fio à meada. Chega a faltar o ar!

É que as vozes mudam e o leitor tem alguma dificuldade em perceber quem é quem, embora se perceba que o peso do outro e de outras fases da vida sejam tão ou mais importantes que o presente, em que um homem, o professor de grego, está a cegar e uma mulher, a aluna, encerrada no seu mutismo, não toma a palavra. 

Nesse aspecto, a narrativa está bem conseguida, ela não fala e quer sumir-se para dentro de si e da escuridão das suas roupas negras, então a narração é assumida por um narrador que tudo sabe. Que fala por ela.

“A única pessoa que sabia que a sua vida estava violentamente dividida em duas era ela própria. As palavras que anotava na parte de trás do diário contorciam-se por vontade própria, formando frases estranhas. De vez em quando essas palavras metiam-se no sono como espetos…”

No caso do professor, ele quer falar, precisa falar, então é-lhe dada voz enquanto recorda a fuga para Alemanha e o regresso à Coreia do Sul, um pai, uma mulher…