Dono de um olhar provocante e misterioso, Martin Amis escreve de uma forma ainda mais provocante e atribulada, especialmente para a época em que foi escrito Money (1982), mas podia perfeitamente ser um diário de um actual industrial.
Ao ritmo alucinante do dinheiro, movido pelas perversões demoníacas de quem o possuí em excesso, se bem que na opinião do personagem John Self nenhum dinheiro está a mais e realmente de excessos vive, facilmente alucinado com álcool, prostitutas e dinheiro. E claro, droga, na droga de vida que leva.
A história negra e depressiva da vida de John Self é, com certeza, uma metáfora muito bem conseguida, que retrata toda uma sociedade que cria dinheiro a partir do dinheiro e que se rege pelas regras deste, não aprofundando relações, confiança, amor ou qualquer outro sentimento. A sua lealdade é apenas para com o dinheiro.
Aqui toda a gente tem um preço, o dinheiro fede e é pestilento, o amor é sinónimo de sexo e pornografia, a mulher é sinónimo de objecto que se compra e troca, bem como qualquer outra pessoa que se interesse por dinheiro, tenha ou queira mais dinheiro. Pois para tudo e todos existe um preço.
Não sei se devemos sempre associar dinheiro a crime, corrupção, mentiras, falsos amigos e superegos, mas a verdade é que este livro os relaciona entre si e com tudo o que é doentio, imaginário, alucinante e viciante.
Money, dinheiro, cheta, pilim, papel... um abismo de sinónimos, um precipício para o qual a sociedade moderna caminhou, tornando-o apreciado e desejado. Ter mais é sinónimo de estatuto, mesmo que o mais possa muitas vezes ser a queda monstruosa aqui descrita.
Quero ainda acrescentar que ao fim de umas 150 páginas habituamo-nos à linguagem e à vertiginosa e caricata forma de escrever de Martin Amis.
A propósito da sua escrita, existem dissertações num misto de alucinações, muito bem esgalhadas que no meio de tanta loucura parece impensável pararmos para reflectir, mas mesmo a quente, como surgem, são ideias muito lúcidas e actuais.
"O medo caminha de cabeça erguida neste planeta. O medo quer, pode e manda, próspero e eminente. O medo tem-nos a todos presos por um fio aqui em baixo."
"A minha cabeça é uma cidade, e há várias dores que para lá foram morar."
"Eu tenho uma teoria acerca das punhetas. Acontece que preciso de contacto humano. Como não há aqui nenhum ser humano, tenho de ser eu a fornecê-lo. Pelo menos não tenho que pagá-las, são gratuitas, não exigem compromisso financeiro."
"Muito mal se diz da vida, mas é raro ouvir-se uma palavra de censura ao dinheiro. O dinheiro, isso sim é que é uma merda boa."