quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

A Valsa Lenta das Tartarugas de Katherine Pancol - Opinião

Por entre os olhos amarelos dos crocodilos, cresceu a curiosidade pelas tartarugas de Katherine Pancol.



A valsa lenta, deliciosa e até charmosa da família Cortês, mais precisamente as peripécias de nossa escritora fantasma, revelam-se agora mais expostas e mais integradas na vida parisiense, mas sempre sem dar muito nas vistas, já que a mãe, escritora, irmã e mulher, é um misto de sensibilidade e mistério que enreda muito bem todas as histórias que se vão passando.


Quem sabe esta valsa é mais um tango ou um pasodoble já que traição, mentira, hesitação e intensidade exigem uma coreografia mais arrojada. Talvez até uma dança ao género de um policial que se espalha ao longo de um romance, esse sim, lento como uma tartaruga, um romance em que a protagonista vive com o cunhado e que é sem dúvida arrebatador e consumado entre um peru de natal e um fogão escaldante! ;) Para mim, a melhor parte de todo o livro, especialmente pela forma teatralizada com que a autora nos consegue fazer vivenciar a sua própria fantasia e conto de fadas.


Concordo completamente com a sinopse do livro quando nos diz que, obstinadamente estas personagens avançam a passos lentos, num mundo rápido e acelerado, que não nos vê, ouve ou sente, mas no qual, persistimos e lutamos para vingar com sucesso em todas as áreas da nossa vida, tal qual uma Josephine, uma Íris ou até mesmo um Luca. 

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Money de Martin Amis, Teorema - Opinião

Dono de um olhar provocante e misterioso, Martin Amis escreve de uma forma ainda mais provocante e atribulada, especialmente para a época em que foi escrito Money (1982), mas podia perfeitamente ser um diário de um actual industrial.

Ao ritmo alucinante do dinheiro, movido pelas perversões demoníacas de quem o possuí em excesso, se bem que na opinião do personagem John Self nenhum dinheiro está a mais e realmente de excessos vive, facilmente alucinado com álcool, prostitutas e dinheiro. E claro, droga, na droga de vida que leva.

A história negra e depressiva da vida de John Self é, com certeza, uma metáfora muito bem conseguida, que retrata toda uma sociedade que cria dinheiro a partir do dinheiro e que se rege pelas regras deste, não aprofundando relações, confiança, amor ou qualquer outro sentimento. A sua lealdade é apenas para com o dinheiro.

Aqui toda a gente tem um preço, o dinheiro fede e é pestilento, o amor é sinónimo de sexo e pornografia, a mulher é sinónimo de objecto que se compra e troca, bem como qualquer outra pessoa que se interesse por dinheiro, tenha ou queira mais dinheiro. Pois para tudo e todos existe um preço. 

Não sei se devemos sempre associar dinheiro a crime, corrupção, mentiras, falsos amigos e superegos, mas a verdade é que este livro os relaciona entre si e com tudo o que é doentio, imaginário, alucinante e viciante.

Money, dinheiro, cheta, pilim, papel... um abismo de sinónimos, um precipício para o qual a sociedade moderna caminhou, tornando-o apreciado e desejado. Ter mais é sinónimo de estatuto, mesmo que o mais possa muitas vezes ser a queda monstruosa aqui descrita.

Quero ainda acrescentar que ao fim de umas 150 páginas habituamo-nos à linguagem e à vertiginosa e caricata forma de escrever de Martin Amis.

A propósito da sua escrita, existem dissertações num misto de alucinações, muito bem esgalhadas que no meio de tanta loucura parece impensável pararmos para reflectir, mas mesmo a quente, como surgem, são ideias muito lúcidas e actuais.

"O medo caminha de cabeça erguida neste planeta. O medo quer, pode e manda, próspero e eminente. O medo tem-nos a todos presos por um fio aqui em baixo."

"A minha cabeça é uma cidade, e há várias dores que para lá foram morar."

"Eu tenho uma teoria acerca das punhetas. Acontece que preciso de contacto humano. Como não há aqui nenhum ser humano, tenho de ser eu a fornecê-lo. Pelo menos não tenho que pagá-las, são gratuitas, não exigem compromisso financeiro."

"Muito mal se diz da vida, mas é raro ouvir-se uma palavra de censura ao dinheiro. O dinheiro, isso sim é que é uma merda boa."

Enquanto Salazar dormia, de Domingos Amaral, opinião

"Que monumento (...) Abençoadas entranhas que a criaram."
O comentário é sobre uma mulher, mas bem que podia ser sobre Lisboa.

Ao ler este romance é impossível não fantasiar com uma Lisboa misteriosa, recheada de espiões e jogos políticos, em tempos estratégicos de uma política ditatorial e de amistosas relações com Inglaterra e com a Alemanha .

"No final da guerra, em 1945, eu já era um especialista em mistificação, boatos negros, sujar o nome das pessoas com intrigas, mas, em 1941 ainda dava os primeiros passos nessa sinistra arte..."

Domingos Amaral retrata, com factos mas recorrendo ao romance, uma Lisboa cosmopolita, ansiosa por novidades, mística e até glamourosa, recheada de intrigas, paixões, luxos e mulheres bonitas, que se passeiam nos sonhos dos nossos protagonistas masculinos.

A propósito de Mary: "Jack, ajuda-me, estou a cair (...). Abracei-a. Mas, mesmo nos meus braços, continuou a cair. Homem nenhum tinha força para impedir aquela queda."

A propósito de Alice: "Sexualmente famosa, acompanhante de luxo, gananciosa, perigosa: Alice tinha todas as características de uma mulher a evitar."

E a propósito de Anika:"(...) murmurou em alemão: Eu sabia que isto não ia resultar. Azar dela, eu tinha aprendido alemão na escola. Por isso repliquei na sua língua: - Isto o quê? Abriu muito os olhos: - Fala alemão? Sorri, de novo cínico: - Ninguém é perfeito."
O que isto me fez rir!

Assim que apanhar mais alguma obra de Domingos Amaral, não hesitarei em ler e se fosse a vocês faria igual.

Deixo-vos com um frase: "O mundo é dos que o conquistam. Não dos que sonham."

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Opinião - "De cada amor tu herdarás só o cinismo" de Arthur Dapieve

"imaginara, também, sem saber por que....o cérebro vive a se auto-sabotar, Adelaide aos chupões com um rapaz negro, suado e forte, sem camisa, espremida num poste."

livro da irmã, lido no trajecto casa-trabalho em 5 dias
resultado final: 5 cantos dobrados, um quantidade infindável de expressão típicas que desconhecia mas fiquei a saber e uma quantidade infinita de pensamentos formulados com sotaque brasileiro.
:)
Livro interessante, fora do meu habitual. Gostei!
Gostei ainda mais de como ele me foi parar às mãos mas isso é outra história. O que me cativou foi mesmo o título
"De cada amor tu herdarás só o cinismo"

e pensando bem, tem muita verdade
quando a vida não corre como queremos, quando os outros não gostam de nós do mesmo modo que gostamos deles, se largamos tudo por algo que achamos ser melhor e no fim ficamos a zeros
é normal que só sobre o cinismo

Quanto ao livro, este fala sobre a vida de Bernardino de Oliveira, quarentão, criativo de sucesso da Manteiga Napoleão III e que teve começou a ver a vida andar para trás no dia em que os seus olhos se cruzaram com os de Adelaide e ela já se encontrava a olhar para ele.
E dai podemos dizer, vem em espiral até ao fundo do poço.

Aborda muita coisa, a diferença de idades, a privação da loucura quando se vive uma vida normal "casado e pai de filhos", o alcool, ali um episódio bem marado com drogas mas acima de tudo, o que me mais interessou, além de uma imagem do Rio por quem lá vive é a autosabotagem que Dino (diminutivo amigavelmente colocado por Adelaide) consegue fazer a si próprio. A autosabotagem de quem está a ficar louco de desejo, de algo mais, de amor, de parvoice.....chamem-lhe o que quiserem.

sábado, 24 de setembro de 2011

Filhos do Abandono, Torey Hayden - Opinião

«Filhos de Abandono» não é um livro complexo de ser lido, ou sequer escrito de uma forma muito literária, nem sequer é dono de um enorme enredo, mas é dono de uma frontalidade que fere e pesa e nos faz pensar sobre o efeito das crianças nas famílias, mas acima de tudo dos problemas das famílias nas suas próprias crianças, danificando-as. Observar a extensão desse dano, que o livro revela, isso sim é complexo.

Torey Hayden, foi ou ainda é, não aprofundei a pesquisa, terapeuta em mutismo electivo,uma patologia associada ao autismo que, apesar de complexa, não é nela que reside o peso desta narrativa. No entanto, são as histórias que envolvem e isolam as crianças aqui descritas que corroboram a balança dos nossos sentimentos e povoam, com obscuridade, a nossa imaginação - deixando questões que se sobrepõem e respostas ainda menos claras.

É um misto muito grande de ganância, orgulho, abandono e dinheiro que justificam o que se passa com estas crianças, no entanto, serão eles, que moldados por estas desculpas que mascaram o abandono, que farão a sociedade do amanhã.
Um trabalho com os terapeutas pode ser uma das soluções, mas fará a diferença crucial e mudará, efectivamente a vida de crianças como estas!?

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Fantasmas do Passado, Minette Walters, Opinião

Há muito que um livro não me prendia tanto à leitura. Ainda não muito habituada aos policiais, assumo que ao início e em especial este título, custou bastante a entranhar, mas depois foi francamente bom, uma agradável surpresa.
As personagens bastante bem delineadas, tornavam-se cada vez mais claras, ao passo que evoluíamos na leitura e nos deixávamos envolver pelas ideias perturbadas, inquisidoras, ambiciosas, dilacerantes das várias cabeças e fantasmas que cada um carrega e que completam esta história.
São histórias de abusos, loucuras, assassinatos e complexos pessoais que se misturam com pudor e até amor, e misturam-se realmente muito bem.
O enredo pega num episódio desafiante e perturbador, com a qualidade, ou mais, das séries televisivas do género que abordem crimes violentos e maus tratos a crianças, com pseudo-detectives mais inteligentes e ousados que os verdadeiros.
Em Fantasmas do Passado a autora faz ainda mais e dá-nos todo um envolvimento realístico, através de um suporte documental, que nos leva para dentro de toda a investigação, tornando a leitura ainda mais envolvente e perturbadora.

Foi intensa e viciante esta leitura e pretendo ler outros do mesmo género.
Se têm sugestões, sintam-se à vontade!

Boas leituras.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

«A vida e as opiniões do cão Maf e da sua amiga Marilyn Monroe» Opinião

Marilyn Monroe vista e descrita aos olhos do fiel amigo, Maf.

Maf foi um presente de Frank Sinatra para alegrar o ícone da moda, da beleza, do cinema, a fantástica Marilyn, à época, devastada pelo rompimento com Arthur Miller.
A depressão, o desgosto, as vicissitudes de quem é famoso e vê a sua vida badalada e exposta a toda a hora foram difíceis de superar para a celebridade e Maf fez parte da solução.

Maf, um cão com uma personalidade astuta, mordaz, altruísta, sarcástica, inteligente e entendido em diversas matérias e com preocupações e sentimentos mais nobres e genuínos que muitos humanos, é assim que Maf é considerado e acarinhado.

Um livro especulativo, biográfico, revelador, quase um diário dos últimos tempos da diva, atormentada pelos seus problemas, dependências, infortúnios, lendas e coscuvilhices à volta dela e por sinal, igualmente à volta do seu Maf, abreviatura para Máfia ou mais uma outra especulação sobre as possíveis participações do próprio Sinatra no mundo obscuro do crime organizado!? Será?
Como podemos nós saber até que ponto as estórias à volta de tais celebridades são ou não verdadeiras!? 

Até à data não sou muito fã de biografias, suspeito sempre do cunho de tais obras. Se forem muito defensivas da personagem em si, fico com dúvida se tanta exaltação é realmente verdadeira, se forem sempre negativas, fico com a sensação de que são mais do mesmo e que nada há que se possa dizer em defesa de celebridade. 

Segue-se a história com interesse, sabendo verídica a existência de Maf, a sua origem escocesa, mas de discutível miscigenação canina... será que é isso que lhe confere tal personalidade!? ;)

Maf esteve com Marilyn durante os últimos dois anos de vida tornando-se numa celebridade como ela, levando uma tremenda vida de VID - very important dog ;)

Enfim, eis um resultado divertido, com episódios hilariantes entre lojas e restaurantes, num quase auto-retrato pela pata narrativa de um cão!!!

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Opinião - "Manhãs Gloriosas" de Diana Peterfreund

Quinta Essência
NOTÍCIA DE ÚLTIMA HORA: A ambiciosa produtora televisiva Becky Fuller é despedida de um programa matinal de Nova Jérsia e a sua carreira começa a parecer tão deprimente como a sua vida amorosa.
Desesperadamente necessitada de um emprego, mas ainda assim cheia de um optimismo sem limites, Becky (Rachel McAdams) promete assentar bem os pés na terra e depara com uma oportunidade no Daybreak, um programa matinal que é gravado em Nova Iorque. Os péssimos níveis de audiência são apenas a ponta do icebergue: os produtores executivos raramente sobrevivem ao intervalo publicitário seguinte e as câmaras antiquadas deviam estar num museu.
Prometendo ao director da cadeia televisiva (Jeff Goldblum) que é capaz de reverter a espiral descendente, Becky faz ao lendário apresentador Mike Pomeroy (Harrison Ford) uma oferta que, por contrato, ele não pode recusar. Acrescenta Pomeroy com êxito à equipa, mas ele recusa-se a participar nas reportagens mais lamechas do Daybreak e em rubricas sobre celebridades, meteorologia, moda e artesanato. Além do mais, antipatiza imediatamente com a sua igualmente difícil co-apresentadora, Colleen Peck (Diane Keaton), em tempos vencedora de um concurso de beleza.
A única alegria na carreira de Becky é Adam Bennett (Patrick Wilson), um colega produtor maravilhoso, mas a alucinação de Daybreak vem dificultar o seu incipiente romance. À medida que a química entre Mike e Colleen no ar se torna mais explosiva a cada dia, Becky é forçada a lutar para salvar a sua vida amorosa, a sua reputação, o seu trabalho, e, finalmente, o próprio Daybreak.

Veja aqui o trailer: http://www.youtube.com/watch?v=s9lWUqraDoU 

A minha opinião: (depois de ter visto o filme)

Quando eu era miúda queria ser jornalista. Eu desejei ser muita coisa, passando por veterinária, hospedeira de bordo ou famosa (não interessava saber em quê).
Sempre achei que seria interessante trabalhar nos bastidores de grandes produções, fosse de publicações ou televisão. Talvez por isso gostasse tanto de ver a Betty Feia ou há já meio século atrás, até fosse extremamente devota da Murphy Brown.
Por esse motivo, este Manhãs Gloriosas despertou tanto interesse em mim. A Becky, mesmo “workaholic” e desprovida de vida social, é uma fatia daquela imagem ideal que sonhava para mim em pequena mas ao saber o que sei hoje percebo que a vida não é assim tão cor-de-rosa como a via em pequena.


Os trabalhos dos nossos sonhos nem sempre estão ao nosso alcance, a nossa dedicação raramente é valorizada e apenas se lutarmos com muito afinco, conseguimos aquilo que queremos.
Ao ler este livro é exactamente isso que vejo, alguém que tem um sonho e mesmo quando cai e tropeça pelas escadas abaixo, não deixa de se levantar com um sorriso e continuar a subir.


Sem dúvida que se querem consumir o livro e o filme, devem-no fazer por esta ordem e não ao contrário (como eu fiz). Deste modo, quando me deparava com os momentos transcritos, à letra, do argumento cinematográfico não precisava de magicar na minha cabeça como seria aquela cena, bastava recordar o que tinha visto no filme alguns dias antes.

Vê esta mesma critica no meu blog :) faz meio século atrás quando vi o filme e li o livro num fria tarde de Março em São Pedro de Moel a beber cházinho

«Diário Sexual e Conjugal de Um Casal» de Marta Crawford, opinião

Marta Crawford tem o dom da simplicidade e de chamar as coisas pelos nomes sem que as mesmas ganhem um sentido vulgar, despreocupado ou diminuído.
Seja o "casal casado", o "casal enamorado", o "casal amante"... heterossexual, bi ou homo... o que interessa é que todos procuram respostas para o dia-a-dia das suas relações e o mais importante é sempre reconhecer que se procuram essas soluções.
Isto poderia facilmente tornar-se no SA - Sexualidades Anónimas (quem sabe um grupo a explorar), mas o que é verdade é que muitos casais frequentam terapia e superam os seus problemas e elevam a outro patamar a sua vida sexual, tornando assim a relação muito mais satisfatória..

Este livro é um relato de pequenos excertos de pensamentos, conversas e troca de ideias entre os vários personagens, como Joana, Miguel ou o irmão mais novo que é gay, ou a Matilde e o Bernardo que quando casados eram como gato e rato e depois do divórcio "levam uma relação colorida". Há também o tipo que tem dificuldade em se comprometer e então... "come todas". Há claro, no meio de tudo isto, as condicionantes do ambiente que os envolve, os pais, os filhos, as relações familiares e de amizade, o trabalho e a bagagem emocional.

Marta Crawford consegue fazer um misto entre relatos de consultas, explicações quase como se se tratasse de um manual, tudo numa leitura fácil, descomplexada, esclarecedora, mas bastante introspectiva, já que todos temos problemas (não vale a pena negar).

Uma leitura adequada ao verão;)

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

"Os Olhos Amarelos dos Crocodilos" de Katherine Pancol, opinião

A escrita, a enfabulação e as metáforas utilizadas por Catherine Pancol foram uma inspiração, pois apetece-me escrever ao reler o que destaquei neste livro.
Utilizando uma excelente combinação de palavras, a história de Josephine, Philippe, Antoine, Hortense e da pequena Zóe acompanham-nos como se estivessem mesmo ali ao nosso lado, tal como a reserva africana de crocodilos ou as ruas e cafés de Paris.
A frieza e a vaidade de algumas mulheres comparada com a delicadeza mascarada de outras, a combinação de diferentes feitios que se completam e protegem compõe assim a história das irmãs, sejam elas Íris e Josephine ou as pequenas Hotense e Zóe. As diferenças entre vários tipos de mulheres, as aventuras e emoções que constituem as suas vidas, se se cruzam ou se afastam e voltam a unir, porque na fraqueza de umas se descobre a força e vontade de outras. É assim este enredo, cheio de reviravoltas e peças que vão desencaixando e encontrando novas silhuetas de encaixe.

Neste livro, Pancol viaja pelos sentimentos dos outros e facilmente apela aos nossos. Uma leve mistura de fantasia (em que tudo pode acontecer, basta acreditarmos) com um relato transparente e apaixonante da dura realidade que nos pode envolver, desde o desdém à falta de dedicação ou amor, porque por vezes apenas há um elevado muro de mentiras que nos separa e afasta daqueles de quem era suposto estar próximo, unido e confiante.

Um livro que questiona o amor, a mentira, a união, a família, o materialismo, a força interior, mas acima de tudo questiona cada um no seu Eu mais profundo.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

«Tudo o que eu tenho trago comigo» de Herta Müller - Opinião


Tudo o que eu tenho trago comigo. 

Ou: Tudo o que é meu trago em mim.



Talvez estas sejam as frases mais passíveis de resumir este livro. Um livro muito pouco passivo, esgaçando o relato histórico e biográfico, surpreendendo pela crueza com que está escrito, transcende a própria história, transcende o homem desprovido de bens, transcende a nossa capacidade de ler sobre tanta miséria, fome, morte e pobreza. Transcende a desumanização de que foram vítimas milhões de pessoas aquando na Segunda Grande Guerra.

Um livro que se faz notar pelo peso que tem, para além do Prémio Nobel, mas antes pelo peso de cada palavra, uma a seguir à outra, cirurgicamente escolhidas e estrategicamente colocadas para nos fazer viajar por tamanha brutalidade como a doença da fome, que se alastra pelo corpo ao mesmo tempo que consome a mente, rendilha as ideias e os sentimentos.

Este livro arrepiou-me tantas vezes que algumas mo fizeram fechar, a dimensão do sofrimento humano é tal, que chega a ser difícil de continuar a ler. 



"A Irma Pfeifer jazia no meio, de cara voltada para baixo. A argamassa fazia bolhas (...)A cabeça afundou-se e o barrete flutuou lentamente até ao bordo, como pomba emproada. Com as mordidelas dos piolhos em crosta, a nuca rapada (...) a Irma Pfeifer desceu à terra provavelmente vestida e os mortos não precisam de roupa, quando há vivos a morrer de frio.
Achar pode achar-se muita coisa. Saber é que não."

A frieza das palavras, a rapidez com que as coisas acontecem, os pensamentos duros, nus, crus, cozinhados apenas na dor causada pela fome, são para mim atordoantes e assustadores.

"O anjo da fome deita um olhar à sua balança e diz: "Ainda não estás suficientemente leve..."
E com rapidez, de lábio empinado, comi então todas as cascas de batata enregeladas.
E chega a noite. (...) E todos sobem para a fome...
(...)
Quando a fome aperta mais, falamos da infância e de comida. (...) Umas vezes é o pato recheado à evangélica, outras, o recheado à católica."

Volker Weidermann refere que esta é uma obra que se alimenta do horror, eu acrescentaria que se alimenta antes do poder de gerar horror, numa tal dimensão que nos deixa alerta para o respeito e a humildade com que devemos olhar à história e retirar dela todas as lições que o futuro nos pede. Sei que pode parecer filosófico, mas a guerra é o horror daquilo que uns são capazes de fazer contra os outros, por necessidade, por defesa, por obrigação ou por poder e ilusão. A verdade é que a guerra é um complexo de horrores, de mortes, de atrocidades, cicatrizes que marcam toda uma história mundial.

Já quase no final do livro, no capítulo "a gente vive, vive só uma vez", as primeiras palavras são curtas, concisas e arrepiantes - "a alimentação do corpo permanece até hoje um mistério para mim."


"A minha radical prática de abandono. Preciso muito de proximidade, mas sou incapaz de me entregar. (...) Desde o anjo da fome, não permito que ninguém me tenha."


TAMBÉM LÁ ESTIVE (...) EU FIQUEI LÁ (...) DE LÁ NÃO CONSIGO SAIR



Apaixonei-me! Rébecca Dautremer ilustra "O livro que voa" de Pierre Laury

A combinação é perfeita... a escrita simples e mágica de Pierre Laury e a ilustração sonhadora e apaixonante de Rébecca Dautremer em o "Livro que voa", da Editora Educação Nacional, ganho com muito prazer no passatempo do D'Magia ;)



Pautado pela música, pela ventania, pela vontade de ser livre, este livro só queria voar e dar asas às suas letras... à sua própria imaginação.
Esta é a história de um livro que se faz amigo de pequenos pássaros, é a história encarnada de Ícaro e das suas asas quase tão verdadeiras como as dos pássaros, mostrando que a vontade de voar reside em nós, na nossa força.
Voar é levar as letras a outras paragens, fazer com elas novas palavras, novas histórias, é criar e deixar que cada um de nós possa imaginar. Tal como estas divagações que hoje aqui faço, fugindo assim à história deste livro sonhador.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

MEDO, Jeff Abbott



Não sei se o MEDO, será o caminho para o PÂNICO ou se passarei a CONFIAR EM MIM, só sei que estou em rota de COLISÃO.
Era uma frase digna de um passatempo e é também um resumo, numa única frase, que para alguns poderá não fazer sentido, mas para quem lê Jeff Abbott e consumiu todos esses títulos, resume bem os enredos acelerados do autor.

A sua escrita é simples, mas a trama complicada, as personagens são fáceis de entender, mas têm dramas confusos, vêm coisas que mais ninguém vê, sentem medos que os afastam, mas que os tornam iguais uns aos outros e daí uma certa colisão.

«Medo», é um drama psicológico com pouca carga emocional, mas carregado de histórias que podem apelar ao sentimento dependendo da sensibilidade do leitor.

Medo, revela-nos a história de Miles, Celeste, Nathan, Allison, a visão de Andy e Groote, bem como de algumas outras personagens, todas elas lutando pelas suas próprias necessidades, que apesar de os tornar diferentes, torna-os perseguidores de uma cura, um medicamento ou apenas descobrirem quem são. 

Neste jogo psicológico e arriscado, as interpretações podem ser diversas.