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Em "Os Dias Contados", João Tordo transporta-nos para fevereiro de 2013, onde um acidente na Serra Nevada desencadeia uma série de eventos que culminam no primeiro grande caso da subcomissária Pilar Benamor. Este thriller mergulha-nos na personificação do mal, mas não esquece as crises familiares e existenciais de cada personagem, com um toque de humor muito peculiar, especialmente na dupla pai e filho que foram as partes que mais me conquistaram.
Por outro lado, quando peguei no livro achava que ia ler sobre um novo caso de Pilar Benamor, completando assim a trilogia, mas vê-se logo que não fui pesquisar sobre o livro e o processo de escrita, caso contrário teria percebido que um acidente pessoal fez nascer a personagem de Flores Baltazar que com os (seus) dias contados virou o livro numa prequela 😉 e em muito boa hora.
A narrativa centra-se nesse como. Inicia-se com o regresso do compositor Flores Baltazar e da sua família de umas férias de esqui que acabaram abruptamente devido a um acidente grave. Este retorno é apenas o prelúdio para uma espiral de acontecimentos inquietantes, remexendo no passado de Pilar e de um caso que foi inesquecível para o seu pai – o caso do Embalsamador, um psicopata que aterrorizou Lisboa e assombrou o fim da carreira do agente Benamor.
“Parecia-lhe, por vezes, que deixara a sua vida chegar a um ponto de não-retorno, e que teria uma montanha imensa para escalar no regresso à normalidade.”
E montanhas vão ser muitas. Áridas e gélidas. Para outros, o ponto de não-retorno é definitivo e não há regresso possível à normalidade.
A história é intricada, mas diria ser menos do que o habitual, centrando-se até em detalhes bastante do quotidiano e isso agradou-me muito, no entanto, o enredo cruza a actuação policial em Lisboa, crime e prostituição e uma rede de tráfico de mulheres com raízes no Leste e tradições familiares perigosas. E os Baltazar com as suas peculiaridades muito próprias de família desconectada. Sem esquecer o aprofundar da história de Pilar e da equipa que a rodeia.
“Acordou mergulhada na escuridão. Eram quase dez da noite. A solidão era palpável, qualquer coisa que se infiltrava no ar, uma molécula diferente e única para ela, que os outros seres humanos não respiravam. Era isso a solidão: significava menos a ausência dos outros do que a crença de que eles existiam noutra dimensão.”
Complexa, obsessiva e atormentada, Pilar é uma personagem que se sente separada da realidade, não quando investiga ou se depara com a criminalidade cara a cara, mas quando quer interagir na esfera pessoal; há uma distância intransponível entre a própria existência e a dos outros, como se habitassem dimensões distintas. Um desajuste quase que metafísico alimentado por um isolamento profundo que resvala para eventos violentos e tóxicos. O afastamento é compulsivo, ficando muito claro neste livro, que a morte do pai cimentou isso.
"Os Dias Contados" é mais do que um simples thriller; é uma exploração das várias faces das relações familiares, revelando as consequências extensas dos erros dos adultos. Erros que se repercutem e Tordo explora isso muito bem com as suas personagens atormentadas, perdidas à procura de si. À procura de sentido.
No entanto, é uma história simultaneamente sombria e luminosa, deixando-nos muitas vezes a rir perante alguns episódios e até enternecidos com outros.
Agora, venha daí o “verdadeiro” terceiro volume da saga de Pilar Benamor!
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