
A força sísmica da escrita de Eva Baltasar em pouco mais de 120 páginas.
“Tinha vivido agarrada a uma certeza impalpável, protegida por três ou quatro coisas indispensáveis que me diferenciavam de uma marginal, de uma excluída. Precisava de enfrentar o vazio, sonhei-o ao ponto de fazer dele um mastro, o centro do meu equilíbrio onde me seguro, quando a vida se desmorona à minha volta. Vinha do nada, envenenada, e ansiava por terras uivantes.”
“Fumo mais do que nunca, mas fumar sozinha na noite é uma maneira de alimentar o feitiço, convoca o corpo desejado e fá-lo entrar pouco a pouco, até chegar às reservas de ar, até atingir a lembrança mais querida presa na caixa estanque do peito (…) Já nem fodemos. A Samsa não tem sexo, tem um estaleiro obstruído por um único (…) Um filtro finíssimo fecha-lhe a boca do desejo. Dela, nada resta, foi transformada.”
“A língua é, e será sempre, um território ocupado. (…) Só a língua pode fazer-nos pertencer a um lugar, para não nos perdermos. É um substrato que alimenta. (…) Encoraja-nos e adoece-nos, desorienta o nosso instinto animal, torna-nos humanos. (…) Mas também pode ser a mais tirânica. Somos responsáveis por cada palavra, não há expressões inocentes."
Aliás, é precisamente na linguagem que Boulder
encontra a sua complexidade.
