É nas palavras de Ralph Emerson que melhor se resume o que encontramos no enredo que John Willians cria e que torna a Natureza, a paisagem, os animais e o Oeste nas personagens mais vívidas e impactantes deste romance.
«Butcher's Crossing» revela uma América profunda, numa busca pela vastidão do Oeste, já ameaçado pelo avanço da sociedade moderna que começava a impor barreiras à própria Natureza. Um jovem de Harvard, cansado da sua vida académica e urbana, pretende enfrentar as provações e descobrir por si, as experiências que só uma expedição nas montanhas lhe poderá dar e na procura por um mentor, chega até Butcher's Crossing para ter a experiência de uma vida.
Apesar de todo o encantamento que as descrições minuciosas nos causam, há todo um relato de solidão, vazio e dureza que quase causam dor e desconforto no leitor. O frio é inquietante ao ponto de o sentirmos. A passagem das estações do ano demarcam muito bem a passagem do tempo. Longo e infinito, numa demanda diária, numa luta desigual. É apenas o vazio que preenche o tempo que passa entre aqueles homens que apenas partilham um espaço exíguo quando existe toda a vastidão de um vale ou de uma montanha, mesmo ali à mão, mas a barreira imposta pelos rigores da natureza são esmagadores e fazem alterações profundas no Eu que ainda estava por descobrir em Will Andrews.
A invulgar carnificina que mancha a brancura que invade grande parte deste livro, acompanhará o leitor até ao final, a mim acompanhou-me. Na sinopse lemos que o que nos deslumbrará será a natureza humana, no entanto, a Natureza propriamente dita, no seu estado mais puro e violento eleva cada personagem, cada homem a um limite que altera o curso de cada uma daquelas vidas de forma visceral. No entanto, para mim, é a Natureza a verdadeira personagem deste livro. É com ela que nos deslumbramos.
A leitura deste livro surge após uma leitura compulsiva e viciante que obtive com «Stoner» e compará-los é difícil, mas foi impossível não o fazer. A perícia da escrita de Williams mantêm-se, aliás, apura-se, bem mais que em Stoner, mas Stoner tem todo um ambiente literário que o coloca num outro patamar perante as minhas escolhas. Ainda assim, o preciosismo que John Williams coloca nos detalhes das longas descrições que faz dos dias em que os homens aguardam pela caçada ou lutam contra a intempérie poderiam tornar-se enfadonhos ou desmotivantes, mas não, são esses momentos descritivos que abrilhantam o enredo e envolvem o leitor, tornando também este um grande livro. Outra comparação que senti necessidade de fazer foi com «O Deserto dos Tártaros» de Buzzati, mas julgo que é mesmo a escrita de Williams que me leva a isso. Apesar de todo o detalhe quase obsessivo com que Williams carrega os seus livros, há todo aquele deserto interior que povoa as vidas das suas personagens e isso liga-me sempre ao relato inóspito da vida de Giovanni Drogo.
Uma leitura com o apoio DOM QUIXOTE.
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