Eleanor a sibarita, Eleanor a peculiar. Tamanha personagem merece ter um cognome. Este livro é realmente todo feito por uma Eleanor caricata e sem igual que na sua autenticidade consegue parecer diversas mulheres numa só. O seu mundo solitário e reservado abarca o mundo de todos nós, de todos os dias, e talvez por isso este livro seja tão actual, tão próximo e ao mesmo tempo tão longínquo face à dor de Eleanor.
"Até aqui, era tudo perfeitamente adequado. As minhas unhas estão sempre limpas - unhas limpas, tal como sapatos limpos, são fundamentais para a moda, estou sempre asseada; assim pelo menos, posso estar de cabeça erguida quando assumo o meu lugar no mundo, por mais insignificante que seja."
Insignificante ou não, Eleanor causa um embate no leitor, ela é educada, misteriosa, mas tão desconhecedora e inocente em certas coisas que é impossível não dispararmos em gargalhadas face a certos comentários seus.
"O Inferno não existe, claro. Porém, se existisse, a banda sonora a acompanhar os gritos, as torturas com forquilhas e os lamentos das almas condenadas seria um medley em loop constante de «canções de musicais» retiradas da história do teatro musical."
Banda sonora não a descobri, mas uma determinada série ocorreu--me variadas vezes. Em certos detalhes, com os seus sapatos confortáveis, o seu colete e uma certa timidez, Eleanor fez-me lembrar de Betty Feia. Que saudades daquelas tontices.
Ainda assim, Eleanor fez-me rir ainda mais quando dizia coisas nas quais me revia ou sabia ser bem capaz de as dizer.
"Temos vinte e cinco dias de férias anuais e eu ainda só usara três - um dia para recuperação depois de desvitalizar um dente, outro para uma das visitas semestrais da assistente social e um dia extra que juntara a um fim de semana prolongado para poder acabar de ler um volume particularmente longo, mas muito interessante sobre a história da Roma Antiga."
Este não é um típico romance de girl meets boy, é bem mais do que isso e é a personalidade da rapariga que faz toda a diferença. Acompanhamos a mudança e a superação, mas também um pequeno revés e uns tropeções de uma mulher que se quer superar a si mesma, anular antigas vozes na sua cabeça e seguir em frente, ser feliz. É nessa conquista, usual, mas nunca descrita de forma banal, que nos vamos embrenhando aos poucos em Eleanor.
E já agora, a capa, também ela numa perspectiva pouco habitual, sugere uma excelente forma de olharmos a esta educação, a esta mulher.
Boas leituras.
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Um livro PORTO EDITORA
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