Graham Greene apresenta-nos um romance, será? Ou será antes um policial altamente romanceado? Ou até quem sabe um diário de espiões, não que isto seja género literário, mas...!? Ou será ainda uma crónica sobre as dúvidas, com as quais um homem se debate, senão toda, mas grande parte da sua vida!?
Greene apresenta-nos um livro que questiona a felicidade, o amor, a traição, as crenças, a fé, as tentações... o livro explora o factor humano presente em todas as implicações que as nossas decisões acarretam e que por conseguinte não as tornam em nada, fáceis.
O peso entre a razão, o que é correcto, o domínio da verdade, o valor das atitudes e o peso do disfarce, quando todo o mundo conspira em direcções opostas e com objectivos virados para si mesmo, Maurice Castle não é excepção.
Homens como Daintry, Davis, Watson e o próprio Castle são homens que buscam por algo que talvez não venham a encontrar. Numa época dominada pelos interesses do Mundo Ocidental, o peso da "cortina de ferro", os resquícios do "apartheid" e como não podia deixar de ser a guerra pessoal pela moral e pela diferença entre os sentimentos que se têm e os que se deveriam ter.
A divisão emocional, político-partidária, religiosa e até geográfica marcam as passagens que determinam este romance.
O potencial terror da separação, a incógnita que é o futuro e o poder das instituições do século XX tornam muitas das linhas de "factor humano" em linhas de comando e de raciocínio, fazendo "a ponte" para os dias da actualidade, onde, mesmo passado um século notamos as semelhanças para os actuais jogos de poder e de interesses e a pouca transparência nas decisões políticas, económicas e sociais que dominam no nosso cotidiano.
Aquele que é quase o sub título deste livro - "todo o homem apaixonado é um potencial traidor", paira no ar até ao final do livro, remetendo a pergunta sobre que tipo de paixões nos fazem atraiçoar e o que é que se podem, efectivamente considerar uma traição!?!?
Podemos amar uma mulher, um país, um ideal, mas o que podemos mesmo trair senão a nós mesmo!? Esta talvez seja a questão que mais me intrigou...
"Mas Castle nunca conseguiria perdoar aquele oficial educado e impassível da BOSS. Eram os homens daquela espécie - homens com suficiente educação para saberem o que estavam a fazer - que transformavam a Terra num inferno. (...) Os nossos piores inimigos não são os ignorantes e os simples, por mais curéis que sejam, os nossos piores inimigos são os inteligentes e os corruptos."
Esta é sem dúvida a história de homens inteligentes, educados, mas igualmente apaixonados e por isso mesmo corruptos?
"Dizes: não sou livre. Mas ergui a minha mão e deixei-a cair."
É com expressões tão breves e simples que se rege a grandeza da prosa de Greene, a simplicidade, mas a profunda preocupação de Castle com África e o seu povo, está presente em passagens magníficas como a seguinte:
"(...)
- o funeral pode passar sem mim. Se houver vida após a morte, o Davis vai compreender e se não houver...
- Tenho quase a certeza de que existe vida após a morte - replicou Cornelius Muller.
- Tem? A ideia não o assusta um pouco?
- Porque me deveria asssustar? Sempre tentei cumprir o meu dever.
- Mas aquelas suas pequenas armas tácticas e atómicas. Pense em todos os pretos que irão morrer antes de si e estarão ali à sua espera.
(...)"
Mais uma vez repito que a simplicidade como certas passagens estão colocadas, são altamente escrutinantes, apenas posso dizer que não apreciei a frieza da morte de Buller, mas isso já factores humanos...
... foi um cenário com o qual me deparei e nessa noite já não fui capaz de ler mais.
Creio ainda que é preciso dizer que Graham Greene foi notável no mundo da escrita, um autor altamente atento tanto às particularidades do ser humano como à história que envolve e evolui para o mundo dos nossos dias, a sua importância é tal que existe anualmente Graham Greene International Festival.
"Ele vai ser lido e lembrado como cronista fundamental da consciência e das ansiedades do ser humano do século XX."
Observer
Agora fica a faltar o visionamento do filme "Invictus" e perceber até que ponto a história de Castle e Sarah se misturam com o livro inspiracional "The Game That Changed The World” de John Carlin.
Até lá, boas leituras e quem sabe, boa sessão de cinema.
Um livro, CASA DAS LETRAS
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