"(...) a possibilidade do fracasso era a receita do sucesso. Quanto mais vezes o andarilho na corda bamba ameaçasse a queda, desequilibrando-se, (...) mais empatia o espectador sentia por ele. A perfeição não era perfeita, por assim dizer; a perfeição era andar no limite do imperfeito, e essa, sim, era a autêntica arte."
O isolamento e o mistério em torno da Quinta do Tempo, juntamente com o seu mentor Millhouse Pascal e a sua actividade ultra-secreta são o conjunto perfeito para pôr a vida do narrador na corda bamba, fazendo-o aspirar não pela perfeição, mas pela existência simples e pacata de outrora. No entanto, a literatura e o amor, puxam o protagonista para uma espiral de contradições que lhe atravessam a vida por várias décadas e é navegando nesse friso do tempo e de lugares insólitos que vamos acompanhando o narrar dessas memórias até ao tempo presente.
"Mais tarde, pensei se haveria, na verdade, alguma espécie de estranho engenho dentro da cabeça de um homem que o impedisse, a partir de certa altura em que já nada espera, quando aprendeu a aceitar a derrota, de conseguir reconhecer aquilo sem que lhe parecera, em tempos, que não podia viver. Ansiamos por esse momento de felicidade; ele surge (...) e, de repente, não acreditamos nele, por estarmos tão acostumados à sua irrevogável ausência."
Se a felicidade, essa busca incessante for em si mesma uma vida, podemos considerar que o perdão e o aceitar do passado são outra, mas o que podemos esperar de uma terceira vida? Uma vida já plena de aceitação e suas rotinas sem as quais tememos definhar?
Habitam sempre os romances de João Tordo inúmeras questões taciturnas e considerações melancólicas que põe os personagens à deriva e por vezes também o leitor.
"É impossível, a partir de um certo ponto, esconder o passado ou aquilo que fomos. Fica impresso nos nossos traços como uma cicatriz invisível, a denúncia de uma duplicidade insuportável para os outros e para nós próprios."
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